A entrevista

Bacana é quando você recebe uma mensagem sábado às 15h30 pedindo para você estar às 17h do outro lado da cidade para uma entrevista. Tudo bem, Dublin é uma cidade pequena, nada é assim muito longe... Mas tem que se preparar, encontrar a linha certa do ônibus, ver no mapa onde vai descer... Mas enfim! Precisando de emprego, a gente faz tudo o que for necessário!

E assim, lá fui eu.

Nós aprendemos aqui o seguinte: nós vamos com o google maps do celular ligado no ônibus, ele tem todos os pontos, e assim sempre sabemos onde descer. Estou eu acompanhando o caminho e já me preparei para descer as escadinhas (sim, eu sempre ando no andar de cima do ônibus, é muito mais divertido), o ônibus faria uma curva e eu ia descer no próximo. Ainda tinha que nadar uns 5 minutos, era 16h50. Eu estava em tempo.

Assim que o ônibus virou e eu dei o sinal, o 3G do meu celular simplesmente caiu e não voltava mais! Adeus google maps!

Desci no ponto porque sabia que era o próximo, mas não fazia a melhor idéia de para onde ir.

Comecei a procurar os nomes nas ruas e nada de plaquinha.

16h54

Entrei no mercado na esquina e perguntei, nunguém sabia onde era a rua. 

16h57

Liguei para a mulher.

Ele mandou ficar no ponto e ela me buscaria. Perfeito.

Lá fomos nós, no carro ela me explicou que ela estava ajudando mas na verdade a vaga era pra cuidar dos filhos da irmã dela.

Entrei na casa, fui devidamente acomodada na cozinha e até me ofereceram um café ou chá. Pedi um copo d’água.

Então, minha entrevistadora sentou na minha frente, abaixou a cabeça e colocou a mão entre os olhos (sabe, gesto de pensando? Com o polegar e o indicador apertando a base no nariz entre os olhos?) e disse pra ela mesma: Não estou num bom dia para entrevistas!

Levantou a cabeça e falou:

- Fala ai, o que você quiser sobre você.

Bom, falei o básico... brasileira, professora de educação física, meus objetivos vindo pra Irlanda... bla bla bla

- Ok...E você já trabalhou aqui na Irlanda?

- Ainda não, estou procurando meu primeiro emprego.

- Ah... (abaixou a cabeça exatamente no mesmo jeito da primeira vez) ... eu não estou num bom dia para entrevistas. E você ta morando onde?

Respondi essa e seguiram mais umas duas ou três perguntas e ela abaixou a cabeçade novo...: - Hoje não era um bom dia pra essa entrevista.

(ocupei minha boca com um pouco da água que ela tinha me dado, porque eu realmente não sabia o que falar)

- Você me da um minuto?

- Claro.

Ela saiu, fechou a porta da cozinha e eu fiquei ali... entre 6 e 7 minutos, dai ela voltou, sentou e falou: - Desculpe, hoje não esta sendo um bom dia. Mas vamos lá: o que você gosta de fazer no seu tempo livre?

Respondi e umas 2 perguntas depois ela abaixou a cabeça... – Não consigo pensar nas perguntas, hoje não era um bom dia para entrevista. Mas ok, o que você pensa em fazer para entreter as crianças no tempo livre.

Comecei a falar e ela me interrompeu:

- Preciso ir ao banheiro, você se incomoda?

- Não, claro que não.

Sozinha na cozinha de novo comecei a procurar rotas alternativas de fuga, porque eu tinha reparado que ela trancou a porta que eu entrei. Pela janela não dava e eu não sabia como era a janela da sala... Ela voltou:

- Não quer mesmo um chá? Um café?

- Não obrigada!

- Então, você tem referencias?

- Só do Brasil,ainda não trabalhei aqui.

- Ah é... Nossa... acabei de pensar numa pergunta para fazer, mas esqueci... hoje esta sendo um dia difícil...

- Vamos fazer assim? A Sra. fica com o meu telefone e qualquer dúvida que tenha ou quando lembrar as perguntas ou quando estiver num dia mais tranquilo, a Sra. me liga, que tal?

- Ah! Acho melhor... hoje não estou num bom dia para entrevistas

(Eu JÁ entendi!)

Ela pegou um papel, anotou meu nome telefone, algumas informações que ela achou necessárias e eu já estava em pé ao lado da porta.

- Obrigada.

- OK, obrigada por vir. Não quer um chá ou um café antes de ir embora?

- Não, obrigada, estou bem.

- Ok, qualquer coisa eu ligo.

- Perfeito. Tchau tchau!

Sai, passei o portão e pensei: what a fuck?